domingo, 17 de abril de 2016

Vale a zoeira: A Bruxa de Blair 2 - O Livro das Sombras

Caso você esteja se perguntando, sim, esse filme é real. Mas antes que você possa dizer “Mas não faz sentido fazer uma continuação de ‘A Bruxa de Blair’!”, eu lhe direi “Senta aqui, que esta está longe de ser a única coisa nesse filme que não faz nenhum sentido”.

            Desde que foi lançado em 2000, “A Bruxa de Blair 2 – O Livro das Sombras” tornou-se notório como uma das continuações mais desnecessárias e mais sem sentido que um filme de terror já teve. E acreditem quando digo que a concorrência é pesada! Mas, como o título dessa postagem sugere... Será que esse filme é tão sem sentido que chega a ser engraçado? Vale a pena assisti-lo mesmo sabendo o quão ruim ele é?

            Em primeiro lugar, a falta de sentido já começa no seu título. Não, sério! Antes mesmo de começar esse filme já deixa qualquer lógica de lado! Por quê? Porque ele se chama “A Bruxa de Blair 2 – O Livro das Sombras”. Não faz sentido ele se chamar “A Bruxa de Blair 2” porque, falando a verdade, nem é realmente uma continuação de “A Bruxa de Blair”. Há referências aqui e ali ao filme original, principalmente no começo, mas se você tirar essas referências e mudar alguns nomes, é perfeitamente possível exibi-lo como um filme solo. Ele nem usa o mesmo estilo de “filmagem encontrada” que “A Bruxa de Blair” inaugurou! No começo aparece escrito que é tudo “re-encenação de eventos reais” (sim, claro, vamos fingir que acreditamos), mas se não fosse por isso seria um filme como qualquer outro! A impressão que dá é que o roteiro foi originalmente escrito exatamente como um filme solo, mas assim que os produtores receberam seu primeiro rascunho eles obrigaram os roteiristas a inserir algumas referências a “A Bruxa de Blair” para tentar arrecadar mais dinheiro em cima dele. Mas isso não é tudo: Não faz sentido ele se chamar também “O Livro das Sombras” porque... Bem... Não há “Livro das Sombras” algum nele! Há breves referências a um livro que dois dos personagens estão escrevendo, mas nada disso chega a justificar o nome “Livro das Sombras”!
            Esse filme vai doer, não vai?
            Mas, se o título já não te avisou do quão ruim esse filme seria, quanto tempo demora para o festival de horrores realmente começar?
            A resposta: Cinco minutos. Não, sério, logo na marca dos cinco minutos, com os créditos iniciais ainda rodando, já é possível notar um dos grandes problemas de “A Bruxa de Blair 2”: Sua edição.

            O filme começa com um intertítulo dizendo “Verão, 1999”, época em que “A Bruxa de Blair” foi lançado. E, de fato, mostra lá toda a coqueluche que o filme original causou, com turistas visitando a cidade de Burkittsville, onde o filme dizia que se passava (embora, ironicamente, ele não foi filmado lá, e esse também não).
            Então “A Bruxa de Blair 2” se passa no verão de 1999, certo? Não! Logo depois aparece outro intertítulo dizendo “Um ano antes” e vê-se um dos habitantes de Burkittsville, Jeff (todos os atores do filme têm os mesmos nomes de seus personagens, então nem me incomodarei dizendo quem os interpreta), em um manicômio.

            Então “A Bruxa de Blair 2” se passa no verão de 1998, certo? Não! Logo depois aparece mais um intertítulo dizendo “Outono, 1999”. Peraí, então ele começa na época do lançamento de “A Bruxa de Blair”, pula para um ano antes, e aí pula para uma estação depois, é isso?
            Bom, ao menos para por aí, certo? Não! Em seguida vê-se esse mesmo Jeff sendo interrogado pela polícia, com uma legenda dizendo “Segunda-feira, 15 de novembro, 1999”. Ok, então começa no verão de 1999, vai pra verão de 1998, depois pra outono de 1999, e então para uma data específica nessa mesma estação do ano. Por que tenho a impressão que alguém da produção assistiu “Amnésia” enquanto o filme era editado?

            Bom, acabou, certo? Não! Em seguida Jeff aparece guiando uma excursão, com a legenda “Sexta-feira, 12 de novembro, 1999”! Então começa em verão de 1999, vai pra um ano antes, então para outono de 1999 e CHEGA!!!!!! Qual é o problema em pegar uma data na qual seu filme vai se passar e permanecer nela?! Não precisa ficar saltando pra frente e pra trás nas datas como um pula-pula em uma máquina do tempo! E o pior é que, embora já não apareçam mais datas (graças a Deus!), o filme continua pulando desse jeito! Você tem a história principal, que é a dessa excursão, e então de tanto em tanto tempo o filme se teletransporta sem qualquer motivo de volta para o interrogatório três dias depois!
            Bom, pelo menos a edição confusa acaba por aí, certo? Ah, vocês já sabem a resposta! De tanto em tanto tempo, há também alguns cortes completamente aleatórios de pessoas sendo assassinadas em algum tipo de sacrifício. E quando digo “cortes aleatórios”, é porque é basicamente isso: Essas cenas duram geralmente apenas um segundo, e aparecem em momentos que não fazem nenhum sentido! Eles estão dirigindo pela estrada, e então surpresa, aparece alguém tendo a cabeça esmagada com uma pedra! Alguém está no hospital, e então surpresa, vê-se do nada uma pessoa com uma faca nas costas! Imagino que a ideia por trás dos produtores (digo produtores porque o diretor já admitiu que a versão final é completamente diferente do que o que ele fez, e que o estúdio impôs várias reedições e refilmagens) era criar um suspense que só se resolveria no final, mas essa ideia falhou miseravelmente porque 1) Na metade do filme já sabemos quem são essas pessoas sacrificadas, então não há suspense nenhum de quem elas são, quem as matou e em que situação; e 2) É irritante demais! Não há nenhum motivo aqui para mostrar cenas que só fazem sentido no final do filme ao longo do filme! O que vocês achariam se, digamos, durante toda a duração de “O Despertar da Força” o filme cortasse de cinco em cinco minutos para a luta final entre Rey e Kylo Ren, apenas por alguns segundos? Seria irritante e desnecessário, não? Agora você sabe como são esses cortes em “A Bruxa de Blair 2”!
            Mas enfim, após mais de cinco minutos de enrolação, a história finalmente começa, enquanto acompanhamos essa excursão formada por Jeff, o guia; Stephen e Tristen, um casal que está escrevendo um livro sobre histeria coletiva, ou algo assim; Erica, uma Wiccan; e Kim, uma gótica. Kim por algum motivo tem poderes psíquicos. Por que ela tem poderes psíquicos? Hum... Por que ela é gótica?
O único motivo que consigo imaginar para ela ter poderes psíquicos é para os criadores do filme terem uma desculpa barata para a história seguir em frente: Tristen está grávida de apenas seis semanas, mas não quer o bebê? Kim diz isso na cara dela sem essa dizer nada. Eles estão fazendo uma festa na floresta regada a álcool e maconha (na qual esses idiotas não falam ou fazem nada de importante e até deixam a grávida participar, porque afinal, como todos sabem, álcool não é nada prejudicial para fetos, certo?) e topam com outra excursão? Kim diz que eles não voltarão (puxa, me pergunto quem são as pessoas que vemos sendo sacrificadas aqui e ali!). Após a festa, eles acordam com o equipamento todo destruído junto com todos os papeis do livro de Stephen e Tristen (que, por algum motivo, literalmente caem do céu como neve, embora ninguém parece notar isso. Eu já disse que eles são idiotas?), sem nenhuma lembrança do que aconteceu (puxa, me pergunto o que eles fizeram! Percebem como essas cenas de sacrifício estragam o suspense?) e as fitas das câmeras que levavam desaparecidas? Kim diz onde as fitas estão. E toda vez que alguém pergunta como ela sabe disso, ela apenas responde “Eu não sei”. Imagino que seja o jeito dela de dizer “Eu já li o roteiro inteiro, ao contrário de vocês!”.
É mais ou menos por aí que o filme diz “Ah, sim, sou um filme de terror, já ia esquecendo!”. Imagina-se então que veremos alguma cena assustadora certo? Bom, parece que o que os criadores desse filme acham que assustador é um pesadelo de Tristen no qual ela afoga seu bebê. Não, sério! Não só é uma cena desnecessariamente desagradável, mas também não é nem um pouco assustadora. Pensando agora, acho que essa frase define o filme inteiro.

            Como é de se imaginar, pouco depois, quando todos acordam e veem o acampamento todo destruído (e com papel picado chovendo do céu. Sério, ninguém acha isso estranho! Stephen e Tristen ficam bravos que o livro deles foi destruído, mas nem se importam com ele estar chovendo em cima deles!), Tristen tem um aborto natural. Embora não antes de termos provavelmente uma das cenas mais mal atuadas que já vi, com todos gritando exageradamente “Essa é nossa pesquisa!”, “Essas são minhas fitas!”, “O que aconteceu?!”, e por aí vai.
            Ao verem o sangue em suas calças, o grupo leva Tristen para um hospital. Lá, ela tem uma visão de uma garota (em naaaaada parecida com a garota de “O Exorcista”) andando para trás e desaparecendo. Quem é essa garota? Por que ela aparece para Tristen? O que ela quer? Nada disso é explicado! A garota aparece apenas mais uma vez no filme inteiro para dizer “Vocês trouxeram aquilo de volta com vocês!”. Nunca ficamos sabendo o que ela quis dizer com isso. Em outras palavras, as aparições dela não têm motivo algum para estarem no filme.

            Bom, depois de uma das integrantes ter um aborto natural, imagina-se que a excursão acabou e todos voltam pra casa, certo? Não! Eles vão então pra casa de Jeff pra ver o que as fitas gravaram. Pessoalmente, acho que a casa de Jeff é até um cenário interessante para um filme de terror: Uma fábrica abandonada da época da Guerra da Secessão, acessível apenas por uma ponte, com um alarme que emite sons de latidos toda vez que alguém abre a porta, que deve ter umas sete trancas diferentes, além de um monte de câmeras vigiando todos os espaços... É óbvio que em algum momento a ponte vai cair, os latidos do alarme se tornarão latidos de cachorros de verdade e as câmeras mostrarão algo diferente do que os personagens viram, mas que seja.
            E caso você esteja se perguntando “Mas e Tristen? Não é extremamente irresponsável com a condição dela leva-la para um lugar caindo aos pedaços e cheio de pessoas desconhecidas, longe de casa e de qualquer atenção médica ou psicológica?”, a verdade é que... Bem... Ninguém parece se importar muito com isso. Tão não se importam com isso que assim que chegam lá vemos Stephen e Erica (a wiccan, caso não se lembrem) se pegando. Lógico que logo depois descobre-se que isso é algum tipo de alucinação coletiva dos dois, mas dá pra ver que tal pensamento lhes passou pela cabeça. Aliás, essa é a primeira de uma longa série de alucinações, coletivas ou não, que os personagens começam a ter enquanto estão na casa de Jeff, mas que nenhum dos personagens se incomoda de contar aos outros e que não fazem nenhum sentido nem tem um motivo essencial para estarem no filme.

            Mas, mesmo descrevendo e comentando a primeira metade do filme, a pergunta ainda permanece: Vale a pena assistir o filme mesmo assim ou não?
            Por mais que, como um fã de assistir filmes apenas pela zoeira, soe tentadora a ideia de assistir um filme constituído principalmente de coisas que acontecem e deixam de acontecer sem motivo ou sentido algum, minha resposta final é... Não. E o motivo é exatamente o meu primeiro alvo de críticas (depois do título, é claro): A edição é tão aleatória quanto o próprio filme, e o resultado é que um filme que poderia ser minimamente interessante (pois decente não acredito muito que seria) acaba se tornando extremamente irritante. Nem dá pra dizer que sua aleatoriedade e sua falta de sentido ou explicação são “vanguardistas” ou que são um “ataque à forma como nos acostumamos a assistir filmes”, como já foi dito do “A Bruxa de Blair” original, pois essa não era a ideia do filme! Falem o que quiser sobre o primeiro filme (eu próprio já falei bastante), mas que ele de fato queria ser e de fato foi um desestabilizador de convenções cinematográficas, é inegável. “A Bruxa de Blair 2”, porém, desde o princípio tinha a intenção de ser um filme de terror tradicional, com apelo comercial fácil, o que o estúdio queria garantir com as reedições da versão final... E falhou miseravelmente! É irritante demais para ter qualquer apelo, entre pulos para lá e para cá no tempo, cenas aleatórias inseridas no meio do filme e uma constante sensação de “Eu não faço ideia do que está acontecendo!”. E tenho a leve impressão de que nem as pessoas envolvidas no filme sabiam muito bem o que estava acontecendo! É por isso que, infelizmente, dou ao filme uma...


Avaliação: Não vale nem a zoeira.

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